sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Uma volta pela cabana





Eu estive longe desse espaço por mais de cinco meses. Ele não tinha esse nome; Achou o Quê? era como se chamava, e se tratava de um blog que, na minha ânsia de ser popular na Blogosfera, acabou se tornando uma grande e, ao meu ver, quase sem sentido gaveta recheada de assuntos que me interessavam, mas que não exatamente traziam meu espírito, quem realmente eu sou. Um blog para resenhas de livros e postagens de cinema, onde eu não me sentia à vontade – olha só que loucura: você não se sentir à vontade no seu próprio espaço – para postar minhas pessoalidades. Meus intimismos, meus pensamentos.

Era uma boa casa. Um organizado e elegante lugar para se viver. Mas desconfortável, que não tinha a minha cara e era certamente quase nada acolhedor.

Eu estive pensando em retornar prum blog há muito tempo, mas foi apenas ontem que tive o estalo, quando, depois de uma longa seca sem escrever nada, sem fazer o que mais amo da vida, dei à luz a uma crítica sobre um filme que adorei. Foi quando percebi que sentia falta da escrita mais do que tudo nesse mundo, e que precisava fazer algo relacionado a isso; precisava recomeçar. Mas de onde? Conversando com uma grande amiga, também blogueira, percebi que simplesmente precisava recomeçar. Dar o primeiro passo. Ter o ímpeto e ir em frente.

our cottage
O ímpeto veio hoje, quando me sentei nesse sofá e disse que só sairia com o esse mesmo blog completamente renovado e, agora sim, do meu jeito. Com a minha cara, sem preocupação com popularidade, parcerias com editoras famosas e falso estrelismo. Um blog meu. Meu, e eu.

E o que saiu foi isso aqui, que vocês estão vendo ao redor. Deem uma olhada comigo.

Essa é uma cabana simples, tranquila, deliciosamente silenciosa, maculada apenas pelas abençoadas vozes dos pássaros e o assoviar do vento no entremeio do inquieto farfalhar constante das árvores. Aqui o clima é deliciosamente ameno, puxadinho pro frio (seria interessante você vestir meias); as paredes e o assoalho são simples, porém firmes e charmosos, e tudo o que preenche os espaços vazios é de uma verdade minha, e só minha. Você pode ver que agora não há tanta coisa assim, mas você vai notar, se continuar por aqui, o meu eu em cada mobília que preencher espaço. Apesar disso, ora, não quer dizer que você não possa também deixar sua marca – isso é uma das coisas mais importantes para mim, se você quer saber. Portanto, por favor: não vá embora sem deixar seu rastro. Essa cabana não é lá tão grande, mas, acredite: nela pode caber você e o mundo inteirinho. Então se aconchegue à lareira. Diga sempre o que acha, o que pensa; resguarde e ponha em punhos sua gentileza, obviamente, mas seja verdadeiro. O poder de verdades unidas por um propósito pode ser catártico.

Então deixe-me dar um propósito a esse negócio todo: discutir. Conversar. Estar junto. Compreender, amigalizar. Introspectar. Empatizar. Ser.

Dei vários propósitos, sim, perdão. Mas sei que somos todos capazes de fazer isso.

Sente-se, portanto. Puxe uma poltrona. Aqui à lareira está mais quentinho. Juro.

Você aceita um pouco de chá?

playlist: FANTASIA


   Todo mundo que me conhece sabe que se há uma área da literatura, e da mitologia, e das histórias em geral pela qual sou apaixonado é pela fantasia. A maior regra na Fantasia é trazer algo que não existe na nossa realidade, e isso sempre, sempre me cativou demais. Olhar para algo e ver aquilo que não vejo todos dias sempre foi reconfortante. Fugir um pouco da realidade, ou até mesmo comparar realidades e procurar uma na outra: a Fantasia, pra mim, sempre foi uma válvula de escape e muito mais que uma distração: foi, inicialmente, uma forma de passatempo, que cresceu para uma curiosidade e passou a ser um verdadeiro e profundo amor. E provavelmente ainda crescerá para o grau "ganha-pão", já que pretendo ter uma carreira como escritor. E é claro que escreveria meu estilo favorito (não só, obviamente – realmente não gosto e nem apoio limitações –, porém principalmente).

   Aqui vai, então, uma playlist de dez músicas que trazem esse tema como plano de fundo ou como ponto principal. São músicas de preferência pessoal, que estão no meu dia a dia e que não só me fascinam, mas me inspiram. Nessa playlist, você encontrará vozes e melodias de fadas, anjos, elfos – absolutamente tudo o que o mundo da magia pôde derramar sobre este mundo para oferecer a nós, queridos humanos. Espero que gostem!


Músicas Fantásticas by Breno Torres on Grooveshark
Gostou da playlist? Tem alguma música a ver com o tema para indicar? Diz nos comentários!

de John Connolly, THE BOOK OF LOST THINGS (2006)

Título no Brasil: O Livro das Coisas Perdidas;
Quem escreveu? John Connolly;
Editora: Bertrand Brasil (selo do Grupo Record);
Tradução: Cecília Prada;
Número de Páginas: 364;
Gênero: Fantasia, Infanto-Juvenil;
Nota (de 0 a 5)5.




Namorei tanto um exemplar de O Livro das Coisas Perdidas da livraria pertinho da minha casa que, finalmente, há um mês, o comprei. Era sempre clássico eu pegar um dos que estavam na estante, olhar carinhosamente, mas nunca levar – sempre acabar preferindo por outro. Eu estava com exatamente vinte e oito reais e oitenta centavos quando fui, enfim, numa terça-feira, vindo da faculdade, até a livraria para comprar esse livro. Eu havia visto o preço um dia antes, e tinha certeza que era aquela a quantidade exata de reais que ele iria me custar. Foi só quando cheguei ao caixa e a moça anunciou que o preço era vinte e oito reais e oitenta e cinco centavos que eu me espantei.

 Mas moça... São só cinco centavos... – Fiz a minha melhor cara de Gato-de-Botas. Ela sorriu docemente e disse que iria cobrir os cinco centavos que faltavam.

O Livro das Coisas Perdidas conta a história de David, um garotinho inglês que, após perder a amada mãe (mesmo com todos os inocentes esforços feitos para tentar mantê-la viva), começa a estranhamente ouvir seus livros conversando entre si. É quase ao mesmo tempo que uma criatura estranha, um Homem Torto esquisito, começa a aparecer em seus sonhos e logo em realidade, e David acaba indo parar, na noite de um atentado, no estranho mundo desse Homem Torto. É quando David começa uma jornada perigosa, impetuosa e por vezes até sanguinária para alcançar seu objetivo: voltar para a Inglaterra, para seu mundo. Local de onde não deveria ter saído jamais.

O livro de John Connolly tornou-se um dos meus livros favoritos de todos os tempos por um motivo simples: escorre fantasia. Há uma grande leva de livros de Fantasia nos dias de hoje, mas poucos, muito poucos, conservam aquelas raízes clássicas da literatura fantástica que tanto amamos. Não é realmente tão fácil encontrar escritas e enredos com uma qualidade tão grande como tanto vimos outrora em C. S. Lewis, Anne Rice, J. K. Rowling e J. R. R. Tolkien, e eu pensava que não encontraria mais algo tão magnífico e bom quanto esses autores. Até ler John Connolly.

Connolly recupera as velhas raízes da literatura fantástica de uma forma incrível, retratando uma perfeita linearidade nos acontecimentos com o protagonista: uma perda intensa, uma realidade de confusão, a fuga, o descobrimento de um novo universo fantasioso, as provações e, enfim, o amadurecimento do personagem. A forma com que essa linearidade é descrita é simplesmente cativante, tudo sendo feito com uma interatividade absurdamente contagiante, fazendo com que a clássica ideia do leitor se sentir na história realmente aconteça. O universo real e o universo fantasioso de Connolly são igualmente palpáveis e perfeitamente bem criados e organizados, ricamente detalhados com uma parcimônia, sem exageros, encantadora. É um livro onde tudo pode se encontrar, mas sem fazer o leitor sentir-se pesado pela quantidade de informações colocada ao longo das páginas.

É muito óbvio que John Connolly trabalhou neste livro com uma sutileza e um cuidado muito grande, pois é tudo muito bem organizado e interligado, além de tudo muito, em questão de enredo, fluido. O enredo escorre como um rio sem empecilhos, calmo, intenso e sem de forma alguma travar. Ler O Livro das Coisas Perdidas é sentar para ler uma leitura relaxante e se divertir com ela. Os personagens são todos incríveis, sejam os com menos aparição, sejam os protagonistas, e algo que realmente me surpreendeu muito no livro foi a questão da vilania. Há dois grandes vilões em O Livro das Coisas Perdidas, além de outros também assustadores vilões: o Homem Torto e Leroi. Toda a maldade e crueldade do livro gira em torno desses personagens, e é exatamente aquilo que você pode chamar de real vilania. São vilões absurdamente cruéis, inescrupulosos, e o que esses personagens fazem acaba por manter e intensificar toda a tensão do enredo. Aliás, esse é um ponto que precisa ser enunciado sobre O Livro das Coisas Perdidas: é um livro que, apesar de fluido e relaxante, também é incrivelmente medonho, cruel e arrepiante. Existe real vilania nesse livro, e não só na questão de acontecimentos e dos vilões em si, mas também em pensamentos e índoles, e também na situação toda que envolve o próprio David. Houve momentos em que realmente fiz cara feia para as páginas do livro, e realmente houveram momentos em que me arrepiei e me assustei com o que li.

Entretanto, ao mesmo tempo que existe real e cruel vilania, também contém real e magnífico heroísmo. Nesse quesito, Rolando (meu personagem favorito) e O Lenhador se encaixam perfeitamente como exemplos: homens exemplares, brilhantes e corajosos, verdadeiros exemplos, mantém o equilíbrio do enredo por pesarem no lado da bondade e magnificência da balança. São personagens trabalhados com uma maestria incrível, que esbanjam empatia e importância no enredo; são partes importantíssimas para o amadurecimento do personagem David, assim, é claro, como os vilões também.

É o grande trunfo do livro, na verdade: o aprendizado incessante de David. O Livro das Coisas Perdidas é uma grande e grandiosa alegoria sobre o amadurecimento de uma criança. David, que entra perdido, triste, amargurado e assustado num mundo cruel e fantasioso, aprende acontecimento após acontecimento, dia após dia naquele lugar, e sua mudança e crescimento podem realmente ser notados pelo leitor. Os aprendizados que David recebe ao longo do livro são inúmeros, assim como as questões trabalhadas no enredo: questões históricas (entender uma guerra, já que o livro se passa no período da Primeira Guerra Mundial), questões familiares (a perda de um ente querido; aceitação de uma nova família), questões sociais (aqui eu realmente poderia citar várias, mas uma me surpreendeu tão enormemente que é a que merece destaque: a homoafetividade – abordada da forma mais sensível, doce, gentil, poética e edificante que eu já li) se misturam em meio à fantasia, que é o que faz O Livro das Coisas Perdidas um livro único por, como até mesmo o Daily Express comentou, intrinsecar o real e o fantasioso de uma forma sensata, surpreendente e admirável.

E em termos de escrita: é impecável. Simples e riquíssima, com um vocabulário encantador e um lirismo hipnotizante, não há como não se apaixonar pela escrita de Connolly. Ela lembrou-me a escrita de C. S. Lewis, tão completa e mágica quanto. Connolly se tornou um dos meus autores favoritos da vida, e com certeza procurarei mais coisas do autor, publicado no Brasil pela Bertrand Brasil, selo da editora Record. Editora, aliás, a qual ando admirando muito e me apaixonando pelo catálogo. O trabalho técnico feito com O Livro das Coisas Perdidas é incrível: tradução, revisão, impressão, diagramação – maravilhoso. Tudo maravilhoso.

O Livro das Coisas Perdidas é um livro de fantasia que realmente ficou marcado na minha memória, e do mesmo para sempre vou não só lembrar, mas também indicar. É um livro que merece ser lido pelo mundo inteiro, um livro que merece virar um best-seller e que também merece ser tombado como um clássico da Fantasia. Se você ainda não leu, dê uma chance para essa viagem mágica de John Connolly. Realmente vale a pena conferir!




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